AGENDA 2020

GIRAS CANCELADAS DEVIDO A PANDEMIA

26/09 (Sáb) - 19h - Festa de Cosme e Damião

24/10 (Sáb) - 19h - GIRA DE PRETOS VELHOS

21/11 (Sáb) - 19h - GIRA DE BAIANOS

19/12 (19h) - GIRA DE EXUS

(senhas entregues das 18:45h às 19:00h)

sexta-feira, 25 de setembro de 2015

A caminho da Luz

Quando alguém pensa em procurar um templo de Umbanda, seja para aliviar alguma necessidade física e ou espiritual que esteja passando, ou mesmo para conhecer a religião, surgem de imediato, diversas dúvidas e uma tremenda insegurança. Neste artigo vamos elucidar alguns pontos que auxiliarão muitos a encontrar um local adequado que realmente condiz à Luz Divina da Umbanda.

            Um templo umbandista, também chamado de terreiro ou Casa de Axé é um local consagrado aos divinos Orixás. E, para que esta energia e força do astral superior sejam realmente presentes o espaço aonde acontece o culto deve ser sagrado. Para isto há que se respeitar uma série de preceitos e cumprir certas obrigações exigidas segundo aquilo que chamamos de fundamentos da Umbanda Sagrada. Pois, no templo é onde ocorre a ligação mediúnica entre as entidades espirituais (mentores e guias de luz) com as pessoas (médiuns). O encontro entre o sagrado e o profano, em que métodos indutores dos estados de consciência são ativamente utilizados, objetivando a incorporação de espíritos benfeitores nos médiuns, afim de, junto com eles, realizar a caridade.

            Muitas vezes o consulente que busca conforto e orientação num momento de dor pode, devido ao desconhecimento, cair nas garras de usurpadores que se dizem sacerdotes (pai ou mãe de santo) que, ao invés de ajudar, acabam criando mais problemas ainda. Infelizmente o fato de alguém pendurar uma placa na fachada de um imóvel como o nome “Umbanda” não garante nada. Por isso é muito importante, para todos que procuram auxílio espiritual pela primeira vez na Umbanda, que se conheça ao menos os preceitos básicos da religião, como ela funciona e quais são seus verdadeiros alicerces.

            Conforme disse o Caboclo das Sete Encruzilhadas em 1908: “a Umbanda é a manifestação do espírito para a prática do bem e da caridade”, sendo assim vejamos alguns elementos que devem ser observados quando adentramos um centro umbandista: 1) a Umbanda crê num Ser Supremo, o Deus único criador de todas as religiões monoteístas: Yahweh para os judeus, Jeová para os cristãos, Allah para os muçulmanos, e Zambi, Olorum ou Obatalá para nós; os demais Orixás são emanações da Divindade, como todos os seres criados; 2) o propósito maior dos seres criados é a Evolução, o progresso rumo à Luz Divina. Isso se dá por meio das vidas sucessivas, a Lei da Reencarnação, o caminho do aperfeiçoamento; 3) existe uma Lei de Justiça Celestial que determina, a cada um, colher o fruto de suas ações, conhecida como Lei do Karma; 4) a umbanda se rege pela Lei da Fraternidade Universal: todos os seres são irmãos por terem a mesma origem, e devemos fazer ao outro aquilo que o outro gostaria que fosse feito a ele, ou seja, devemos respeitar as diferenças e agir com empatia; 5) a umbanda possui uma identidade própria e não se confunde com outras religiões ou cultos, embora respeite e reconhece a todos, partilhando alguns princípios com muitos deles; 6) a umbanda está a serviço da Luz Divina e só visa ao Bem, qualquer ação que não respeite o livre-arbítrio das criaturas, que implique malefício ou prejuízo de alguém, não é Umbanda; 7) a Umbanda não realiza, em qualquer hipótese, o holocausto (sacrifício ritualístico de animais), apesar de respeitar outras religiões de matriz africana – culto de Nação ou Candomblé – que se valem desta prática; 8) a Umbanda não preceitua a colocação de “despachos” ou “oferendas” em esquinas ou vias urbanas, e sua reverência às Forças da Natureza implica preservação e respeito a todos os ambientes naturais da Terra; 9) todo serviço de Umbanda é de caridade, jamais cobrando ou aceitando retribuição de quaisquer espécie por atendimento, consultas ou trabalhos. Quem cobra por serviços espirituais não é Umbandista; 10) a Umbanda é uma religião libertadora e não opressora. Respeita a diversidade e promove a inclusão social por meio da orientação, estudo e disciplina.

            Estas diretrizes servem de roteiro para quem almeja entrar em um templo umbandista de fato e de direito. Embora tenhamos variações rituais de um centro para outro, os fundamentos da Umbanda são pétreos. Além da gratuidade (não cobrança), pois espíritos de luz são benfeitores e não necessitam de dinheiro ou qualquer barganha, agrado, presentes ou favores, verificaremos numa verdadeira Casa de Axé a Simplicidade, Harmonia e Humildade. Jamais há ameaça ou medo aos frequentadores. É considerada uma religião ecologicamente correta, em que o respeito à Natureza é regra imprescindível. Sujar ou poluir o meio ambiente com velas, garrafas e outros restos inorgânicos, não faz parte de sua prática. A Umbanda não é proselitista, não exige conversão à sua causa e aceita democraticamente que seus frequentadores procurem outros cultos e doutrinas. Pois defende aquilo que o Dalai Lama disse: “a melhor religião de todas é aquela que faz de você uma pessoa melhor”. Pronto! Com essas informações básicas qualquer pessoa está apta a iniciar sua jornada a caminho da Luz, em busca de um verdadeiro templo umbandista e colher seus frutos. Axé!

Gustavo C M Souza, é bacharel em História pela USP e dirigente do Centro Espírita de Umbanda Ogum Sete Espadas

Para saber mais:

Livro: Iniciando na Umbanda – Norberto Peixoto, editora Triângulo da Fraternidade


Contato:

www.facebook.com/jorge.guerreira

Texto publicado no jornal "O Guaíra" de 25/09/2015.
O Hino da Umbanda foi composto por José Manuel Alves e oficializado em 1961 no 2º Congresso de Umbanda.  O autor em 1960 foi procurar o Caboclo das Sete Encruzilhadas em Niterói, em busca de cura para sua cegueira, o que não foi concedido devido ao processo cármico de José Manuel. Mais tarde procurou novamente o Caboclo para lhe apresentar uma canção que havia feito em homenagem à Umbanda, a qual foi tomada pelo Caboclo com Hino da Umbanda.
Na letra do Hino aparecem as características gerais da Umbanda, bem como sua Lei maior e sua missão. Ela vem para iluminar e acolher a todos, sem distinções raciais e preconceitos dos mais diversos tipos.  Traz os ensinamentos de Oxalá, do mestre Jesus, para fortalecer a todos, amparar e auxiliar os encarnados e desencarnados. No acolhimento que faz a Umbanda convida todos a encontrar a paz individual e coletiva, incentivando sempre a fraternidade, a formação de uma grande família. O exercício ao amor em todos os níveis, da caridade incondicional.
A mensagem deve ser levada a toda Terra, espalhada  pelo mar, orientada por Aruanda e pela luz divina em prol da vida e da evolução. Traz o incentivo às preces, à oração, à espiritualidade, à fé. Sempre seguindo a Lei maior: o amor e a caridade.
Neste sentido levar ao mundo inteiro a bandeira de Oxalá significa compartilhar o cotidiano, o amor e a paz, e nunca forçar alguém à conversão ou ao comparecimento às giras (Lei do livre arbítrio), nem impor a minha Umbanda como a verdade. A Umbanda é por natureza diversificada, completa e quando observamos essa diversidade, estamos formando a Umbanda.
Letra:
Refletiu a luz divina
Com todo seu esplendor
Vem do Reino de Oxalá
Onde há paz e amor
Luz que refletiu na Terra
Luz que refletiu no Mar
Luz que veio de Aruanda
Para todos iluminar
A Umbanda é paz e amor
É um mundo cheio de Luz
É a força que nos dá vida
E à grandeza nos conduz
Avante filhos de fé
Como a nossa Lei não há
Levando ao mundo inteiro
A bandeira de Oxalá.

Que o Hino da Umbanda esteja sempre em nossos corações. Axé!


Fonte: "O Livro Essencial de Umbanda", Ademir Barbosa Júnior, Universo dos Livros Editora, 2014.

quarta-feira, 23 de setembro de 2015

FESTA EM HOMENAGEM AOS ERÊS


Omi Ibeji. Beje ero! Salve a força das crianças! Salve os Eres, força pura, verdadeira que reluz no céu azul e traga ao nosso lar a paz e a esperança. Zele por todas as crianças.
Neste contexto que estamos convocando todos os irmãos para a integra doação a esta linha tão amanda da nossa querida Umbanda. Para nós umbandistas os Ibejis são Orixás que governam os querubins, a linha da cura. Este Orixá faz parte da tríade mais sagrada da Umbanda. Junto com  Oxalá e Iemanjá. E com a doçura desta linha iremos proporcionar uma homenagem inesquecível. Todos juntos formando uma força tarefa para tal realização. Muita luz a todos.
Salve São Cosme e São Damião.

quarta-feira, 16 de setembro de 2015

A Religião do Futuro



       Apesar de vivermos a chamada Era da Informação, num mundo cada vez mais populoso e globalizado em que não existem mais fronteiras geográficas e as noticias são instantâneas, a vida do ser humano atualmente é marcada por um profundo individualismo; talvez este, seja o maior paradoxo do século XXI.

            Facilitar ou melhorar a comunicação entre as pessoas é uma das intenções quando se busca a inovação tecnológica. Novos meios, novas mídias, novas plataformas; diversos aparelhos, cada vez menores e mais acessíveis etc., tudo isso faz parte da revolução digital; até novas linguagens surgem conforme a rede social: WhatsApp, Facebook, Twitter, dentre outras. Porém o grande desafio que se coloca é a qualidade desta comunicação. Pois, apesar de se falarem mais, as pessoas estão mais distantes. A fórmula: falta de tempo + velocidade + acesso digital resultou numa aparente aproximação; ou seja, as pessoas estão distantes umas das outras e se refugiam nesta falsa sensação de união. A aldeia global das mídias sociais é tão superficial e carente de conteúdo de qualidade que, somente na hora do “aperto” é que notamos o quanto estamos sozinhos e isolados. Milhares de almas divagam perdidas num mundo de aparências; perturbados pela busca do prazer sem limites e da lei do menor esforço. Este clima favorece o menosprezo do corpo: pois se dá importância à estética em detrimento da saúde; a preguiça mental: pois tudo com mais de duas linhas passou a ser “longo demais” para ser lido; e, a pobreza de espírito: pois viver de acordo com uma religião exige disciplina, coisa há muito tempo abandonada. A futilidade e a gana por mais “curtição” passam a comandar a ausência de sentido da vida. Haja vista, as quantidades absurdas de bebidas, cigarros e outras drogas consumidas por um número cada vez maior de pessoas, independente da idade.

            Vivemos um momento em que não estamos “juntos”, mas sim “aglomerados”.  Gente que se julga autossuficiente e que se esqueceu da importância do diálogo frente a frente, do abraço fraterno, da palavra ou gesto de carinho, da família como alicerce social, e, principalmente, se esqueceu de Deus. São os “sinais dos tempos”, poderiam dizer alguns. No entanto, digo, são sinais da ausência de Deus nas vidas das pessoas. Na Umbanda não acreditamos na maldade como algo exterior, uma força que exista por si só, independente do ser humano. A maldade existe onde Deus foi posto de lado e as trevas são simplesmente a ausência de Luz. Neste sentido, em nosso ritual utilizamos velas para materializar as intenções de dissipar as trevas e resgatar o equilíbrio dos três aspectos do ser humano: corpo, mente e espírito.

            A Umbanda é uma religião que acredita e prega a lei do Karma (palavra que significa “ação” que veio da antiga língua sagrada da Índia, o sânscrito), onde para toda ação existe uma reação. Tudo que o indivíduo fizer (ou deixar de fazer) hoje terá uma consequência amanhã, para cada efeito existe uma causa correspondente. Por isso é necessário que as pessoas despertem para a responsabilidade de seus atos e não se julguem como meras vítimas do destino. Por isso chamamos o Karma de justiça celestial, em que não há espaço para os conceitos de “culpa” e “castigo”, cada pessoa receberá de volta o resultado de suas ações, como um mecanismo essencial para revelar a importância dos comportamentos individuais e coletivos.



            Obviamente que o avanço tecnológico é algo positivo e necessário. Não há como negar o futuro, a cada dia nossas vidas serão invadidas por novos aparatos e descobertas numa velocidade estonteante que nos atropela e não dá o tempo necessário para adaptação. Porém cabe a cada um de nós saber utilizar seus benefícios e não permitir que certas facilidades nos deixem preguiçosos e superficiais. Isso ajuda ainda a manter uma vida saudável, cuidar do corpo físico, sem os excessos ditados pela estética da aparência que sabemos ser passageira, enquanto a alma é eterna. Buscar a Deus ou uma religião, seja qual for, é fundamental para não perdermos o rumo neste oceano incerto do futuro que se apresenta. Ocupar a mente com o sagrado é preencher de luz o espírito. É não dar espaço para a futilidade e viver com disciplina, ética e bom caráter. Estes são valores que a Umbanda tem a preocupação de disseminar em sociedade. Buscar um sentido para a vida, saber que desempenhamos papéis e temos responsabilidades, que nossos atos refletirão no amanhã. Libertar do ciclo vicioso do autojulgamento e do julgamento alheio, deixar de ser aquele que corresponde às expectativas do “outro” e da sociedade para sermos nós mesmos, descobrir quem somos nós. Trocar o “ter” pelo “ser”, abandonar a “aparência” e buscar a “essência”. Axé!
           
Gustavo C M Souza, é bacharel em História pela USP e dirigente do Centro Espírita de Umbanda Ogum Sete Espadas

Para saber mais:

Livro: O Axé, nunca se quebra,Irinéia M. Franco dos Santos, Ed. Edufal


Texto publicado no jornal "O Guaíra" de 16/9/2015.

quinta-feira, 10 de setembro de 2015

EXU: mitos e verdades.




            Quando alguém resolve escrever ou falar de Umbanda assume a responsabilidade de elucidar uma série de questões obscuras no pensamento da população leiga de modo geral. A maioria, das pessoas que não a conhecem, associa seus adeptos e simpatizantes à gente ignorante, sem cultura, fanática e fetichista. Neste artigo vou abordar o mito, talvez o maior de todos, que equivocadamente se criou a respeito dos famigerados e incompreendidos Exus.

            Em primeiro lugar volto a frisar que Umbanda é “a manifestação do espírito para a prática da caridade e do bem” qualquer coisa diferente disto: não é Umbanda! Isto posto, podemos prosseguir no conhecimento sobre quem são os Exus. Cujo nome, para muitos, não pode nem ser pronunciado, pois, na linguagem popular Exu é “agente do mal”, “espírito demoníaco”, que com seu tridente espalha maldades pelos terreiros onde “baixa” e aceita “serviços escusos” em troca de bebidas, dinheiro ou favores...

            Quanta falta de conhecimento, quanta inversão de valores e quanto preconceito. Poderia escrever um livro inteiro sobre as origens deste equívoco, porém, afim de não extrapolar os limites deste artigo, podemos dizer, resumidamente, que este mito, esta visão equivocada, surgiu exatamente por vivermos numa sociedade de classes e racista. Hoje em dia, este preconceito é agravado pela intolerância religiosa reforçada pela ignorância em seu sentido literal, etimológico: falta de sabedoria e instrução sobre determinado tema, ou ainda à crença em elementos falsos.

            Para facilitar o entendimento da figura de Exu, podemos fazer uma analogia da Umbanda comparando-a a uma empresa de grande porte, com toda sua complexidade, hierarquia e organograma. Onde cada setor seria responsável por um rol específico de tarefas e atividades, mas, que, no entanto, se complementam como partes de um todo, de acordo com os objetivos da corporação. Desde os sócios majoritários, a diretoria, os altos executivos, até os funcionários da limpeza, da copa, os seguranças, etc., todos são indispensáveis para o bom e correto funcionamento da empresa. Da mesma forma, os Exus têm a sua função; eles representam um dos “setores” dentro da religião. Ou seja, a cada Linha de Trabalho – maneira pela qual dividimos os tipos de guias de luz que trabalham nos terreiros – cabe uma responsabilidade; uma forma, um momento e um campo de atuação próprios nos tratamentos espirituais dispensados às pessoas que buscam auxílio na Umbanda.


            Notem, portanto, que Eles estão enquadrados, sim, como uma das Linhas de Trabalho, dentre os chamados “guias de luz”. Enfim, não existe Exu das trevas ou sem iluminação espiritual! Isso é mera desinformação. Infelizmente o que ocorre são as pseudomanifestações ou as mistificações enganosas oriundas de pessoas sem escrúpulos que usurpam o nome de Exu; charlatões interessados em obter dinheiro fácil às custas do sofrimento e desamparo alheio. Estes, sim possuem seus espíritos envoltos em trevas e um dia responderão por seus atos. Por outro lado para um espírito de luz receber o título de Exu, dele é exigido disciplina, ordem, respeito, estudo, sabedoria, honra, honestidade e acima de tudo “amor ao próximo”.  Todos os verdadeiros Exus trabalham somente para o bem. E sempre atuam em conjunto com os demais mentores da Umbanda, sejam eles Caboclos, Pretos-Velhos, Crianças, Baianos, Boiadeiros, Marinheiros, Orixás, etc. Todas estas entidades são interdependentes nos rituais de Umbanda. Elas se complementam, e formam uma única “equipe” (falange, como chamamos) de soldados de Cristo na luta contra as mazelas vividas pelo ser humano.

            Os Exus são os guardiões espirituais, são os protetores que nos socorrem nos momentos de maior desespero e aflição. Na labuta pelo pão de cada dia, pela integridade física e espiritual, são nossa defesa; mas, também, são forças que atuam na nossa consciência, exigindo retidão no comportamento e atitude ética de seus protegidos. São severos quando é necessária uma correção, mas complacentes perante às suplicas, perante o sofrimento e a dor. O autor F. Rivas Neto descreveu Exu como o “regulador planetário, que atua nos aspectos emocionais, instintivos e nas demandas energéticas, ele ainda neutraliza aqueles que se sintonizam com os planos mais baixos (...) Exu pune, mas não age como mau, pois está apenas executando a Lei. Por isso Exu não é bom nem mau, é Justo
           

            Existem ainda muitas outras questões sobre Exu a serem abordadas. Aspectos históricos ligados às etnias africanas que vieram para o Brasil e formaram o pano de fundo do quadro sócio-religioso que se apresenta nos dias de hoje. Por exemplo, a associação equivocada da imagem de Exu ao diabo, devido, principalmente a simbologia fálica (sexual) de Exu, que nada tem a ver com o pecado cristão; mas que, em verdade, representa simplesmente o culto à fertilidade tanto humana quanto da terra a ser cultivada, pois disto dependiam os povos para sobreviver na rusticidade do continente africano. Assunto para outro artigo... Salve Exu! Laroiê! Mojubá! Axé!
           
Gustavo C M Souza, é bacharel em História pela USP e dirigente do Centro Espírita de Umbanda Ogum Sete Espadas

Para saber mais:

Livro: Exu, o Grande Arcano – F. Rivas Neto, editora Ícone


Contato:

www.facebook.com/jorge.guerreira

Texto publicado no Jornal "O Guaíra" de 10/09/2015

quinta-feira, 3 de setembro de 2015

Orixás e Sincretismo



A Umbanda é uma religião de matriz africana cuja doutrina está fundamentada nos ensinamentos cristãos do amor ao próximo e da caridade espiritual; onde são cultuados os Orixás, seres divinos que representam diretamente O Criador (Olorum, na língua Iorubá), que, também, são determinantes de sua ritualística e filosofia de vida. Para conhecer melhor o conceito de Orixá e seus arquétipos precisamos antes entender o que é o sincretismo e como ele interferiu na formação das religiões de matriz africana no Brasil.

            Historicamente é notória a forma brutal e desumana que os povos negros, nativos africanos, foram seqüestrados de sua terra natal e trazidos para a América para trabalhar como mão-de-obra escrava, principalmente, nas lavouras de cana de açúcar, café, tabaco, algodão e também na mineração. Muitos outros ainda desempenhavam vários tipos de serviços domésticos e urbanos. Estimativas indicam que, entre os séculos XVI e XVIII, 7,4 milhões foram tirados da África com destino à América, dos quais mais de 5,5 milhões vieram para o Brasil. Os negros foram essenciais para a manutenção da economia durante o chamado período colonial.

            Tanto os indígenas quanto os escravos africanos foram elementos essenciais para a formação não somente da população, mas também da cultura brasileira. A diversidade étnica verificada no Brasil decorre do processo de miscigenação entre colonos europeus (portugueses), indígenas e africanos. A cultura brasileira, por sua vez, apresenta fortes traços tanto da cultura indígena americana quanto da cultura africana. Desde a culinária, onde se verificam a feijoada, vatapá, o caruru e chegando até a língua portuguesa; é impossível não perceber a influência da cultura dos povos que foram escravizados no Brasil.                 

            Evidente que, como parte da cultura de uma nação em formação, a crença e a religião fazem parte deste caldeirão de misturas africanas, indígenas e européias. E aí que entra o tal do sincretismo. Uma vez que o negro, subjugado sob domínio do branco, era proibido de realizar qualquer ato pretensamente religioso ou cultuar seus antigos deuses africanos, sob pena inclusive de morte, precisou se adaptar ao sistema religioso dominante – o catolicismo – para manter um mínimo de suas origens e tradições evitando, assim, a total destruição de sua fé primordial.

            A principal expressão desse “adequamento” foi a sagacidade dos negros em fazer paralelos de seus deuses africanos com os santos católicos mais comuns ou mais venerados em terras brasileiras. Também adaptaram alguns rituais africanos à tradição cristã: por exemplo, a incorporação da Lavagem do Bonfim à cerimônia das Águas de Oxalá. Podiam, assim, manifestar publicamente, ainda que de forma dissimulada, sua religiosidade africana. O sincretismo religioso afro-brasileiro já foi retratado em várias obras da literatura, música, teatro e artes plásticas brasileiras. Letristas como Dorival Caymmi, Vinícius de Moraes e Jorge Ben Jor retrataram o tema em diversas canções, enquanto Dias Gomes levou-o para o teatro com a peça O Pagador de Promessas, que, mais tarde, foi levada para o cinema conquistando uma Palma de Ouro no Festival de Cannes e uma indicação ao prêmio Oscar de melhor filme estrangeiro.

            Nas religiões afro-latino-americanas, como é o caso da Umbanda, cada Orixá corresponde a um santo católico, mas, de fato, não se trata de um amálgama. As figuras não se confundem. Muitos dos santos Católicos são cultuados também no candomblé e em outras religiões afro-latino-americanas. Os escravos africanos criaram uma maneira criativa e inteligente de enganar os seus senhores. Invocavam os seus deuses africanos sob a forma dos santos católicos: Oxóssi na forma de São Sebastião, Ogum como São Jorge, Oxalá como Jesus Cristo, Ibejis como Cosme e Damião, Iansã como Santa Bárbara, os fios de contas dos guias de luz chamados de preto-velhos como Nossa Senhora do Rosário, entre outros.


          


               Sincretismo é, portanto, a absorção de um sistema de crenças por outro. Isto ocorreu, também, quando o cristianismo absorveu e adaptou conceitos das religiões pagãs da Europa, moldando-os de acordo com os interesses da Igreja Católica numa tentativa de facilitar a propagação da religião cristã no continente europeu. Um exemplo clássico é a festa cristã do Natal, originalmente uma festa pagã que celebrava o solstício de inverno e o nascimento anual do Deus Sol, mas que a Igreja Católica transformou, no século III, na atual celebração do nascimento de Jesus Cristo com o objetivo estimular a conversão dos povos pagãos sob o domínio do Império Romano.





            É devido a esse sincretismo religioso que chegamos, então, ao conceito de Orixá, desde sua origem africana até como é cultuado atualmente na Umbanda. Etimologicamente a palavra “orixá” vem da junção de dois vocábulos da língua Iorubá: ori, cujo significado é “cabeça” e , traduzida normalmente como “rei” ou “senhor”; logo “orixá” significa “rei ou dono da cabeça”, melhor dizendo: divindade que habita a cabeça. Ou seja, cada filho de santo (crente adepto da Umbanda) possui seu Orixá, o dono de sua cabeça. Cada Orixá relaciona-se a pontos específicos da natureza (florestas, cachoeiras, rios, mares, montanhas, etc.), os quais são também pontos de força de sua atuação, conforme seu elemento primordial correspondente: terra, ar, fogo ou água. Portanto os Orixás são agentes divinos, verdadeiros ministros de Divindade Suprema (Olorum), presentes nas mais diferentes culturas e tradições espirituais e religiosas, cultuados de diversas formas e por diversos nomes. Graças a Umbanda Sagrada é que, hoje, toda a humanidade pode: agradecer, venerar e rogar a essas forças divinas, independente se vai chamá-la de Oxum ou Nossa Senhora! Axé!
           
Gustavo C M Souza, é bacharel em História pela USP e dirigente do Centro Espírita de Umbanda Ogum Sete Espadas

Para saber mais:

Livro: Curso Essencial de Umbanda – Ademir Barbosa Júnior, editora Universo dos Livros


Contato:


quarta-feira, 2 de setembro de 2015

TRADIÇÕES AFRICANAS



         Em sua origem, a Umbanda era bem diferente de como a conhecemos hoje. Porém, algumas características fundamentais permanecem. Pesquisadores encontraram registros dos primórdios do culto que atualmente acontece dentro da Religião Umbandista datados de mais de seiscentos anos de idade, ou seja, durante o período da chamada África pré-colonial; quando o continente africano ainda não havia sido invadido pelos brancos europeus e sua população ainda preservava suas tradições e cultura intactas.

            A região conhecida como África Subsaariana, “abaixo” do deserto do Saara, que compreende a extensão territorial que vai do Senegal até Angola, representa a principal fonte das populações negras massacradas ou aprisionadas pelo tráfico negreiro para servir de mão-de-obra escrava no Brasil. Essas populações eram formadas por diversas etnias que se fixavam ao longo das regiões de savana, em que a caça e a agricultura se mostravam mais viáveis. Essas aglomerações de aldeias sofriam um constante deslocamento populacional motivado por conflitos tribais, desastres naturais ou pelo próprio crescimento demográfico.


            Apesar das mudanças constantes e diversidade cultural o que nota-se é uma origem única que, de alguma forma, permeava todos estes povos em questão: a língua mater. Ou seja, todos pertenciam ao mesmo tronco lingüístico conhecido como Banto. Fato este, que possibilitou o contato e junção de várias tribos resultando na formação dos primeiros Estados territoriais desta parte do continente africano. Essa experiência política mais complexa permitiu o desenvolvimento de um articulado comércio de gêneros agropecuários e ao mesmo tempo, o desenvolvimento de práticas comuns que marcaram os costumes destes povos, inclusive sua crença e religião.

            Um exemplo dessa questão pode ser claramente observado nas concepções que regiam (e regem ainda) a relação dos indivíduos com a Natureza. Em alguns casos as manifestações naturais eram temidas e vistas como uma conseqüência direta do comportamento dos deuses. Diversos rituais eram desenvolvidos com o propósito de apascentar e ou apaziguar tais forças. Verifíca-se, igualmente, a relação compreendida entre os diversos elementos da natureza – animais, vegetais, minerais – como formas ou resultados da manifestação divina; que, além disto, servia (e serve) ainda como fatores determinantes dos comportamentos, das virtudes, dos defeitos e até mesmo do destino do ser humano.

            É inegável, portanto, o quão é fundamental para as crenças de origem Banta a preservação e veneração à Natureza. As forças naturais e seus quatro elementos primordiais – terra, ar, fogo e água – formam o escopo que sustenta as bases religiosas da Umbanda. Basta qualquer leitura sobre o panteão dos deuses (Orixás) africanos para identificar e reconhecer a Mãe Natureza como principal fonte de inspiração e conduta para toda sua ritualística e misticismo. Esse quadro se completa e se concretiza, enquanto religião sagrada, com a união do chamado “quinto elemento”, ou seja, a fé. É a partir do conhecimento e respeito à Natureza somados à força da fé que realmente a Umbanda se estabelece no plano terrestre.

            Uma vez compreendida a Natureza como base crucial para a religiosidade dos negros Bantos, veremos que o segundo aspecto, porém não menos importante, na formação da Umbanda sagrada é a prática, dentro de sua ritualística, da comunicação com os espíritos. Assim como diversas outras doutrinas religiosas ou filosóficas, a Umbanda também prega a sobrevivência do espírito após a morte do corpo físico, e, principalmente na possibilidade de se comunicar com eles, casual ou deliberadamente, via evocações ou espontaneamente. Ou seja, o espiritismo, termo originalmente utilizado para nomear especificamente as idéias e ensinamentos codificados pelo pedagogo francês Allan Kardec em 1857, é inerente ao culto que acontece dentro da Umbanda. Obviamente que o espiritismo de Umbanda ocorre de forma e em situações bem diferentes em relação à prática Kardecista, que por sinal, aliás, muito temos a agradecer e aprender, principalmente devido a sua sistematização do estudo dos espíritos sob a luz de métodos científicos. Não obstante, como foi dito acima, pesquisadores comprovaram que a comunicação com espíritos dos antepassados desencarnados dentro das tradições religiosas dos negros Bantos no continente africano é quase milenar. No próprio território brasileiro temos prova disto; a legendária Casa Branca do Engenho Velho ou Ilê Iya Nassô, em Salvador, Bahia, fundada no século XVIII, cujo registro foi efetuado bem posteriormente em 1830, já praticava o espiritismo de Umbanda, ou seja, bem antes do código de Kardec.

            As origens destas práticas estão localizadas em regiões que hoje correspondem aos territórios de Angola e do Congo principalmente; no culto aos ancestrais reais (pessoas da família), os negros bantos podiam manter contato com seus mortos. Daí, uma das explicações, para o surgimento, após a Abolição, das entidades chamadas “preto-velhos”, os “cacurucaios” (do dialeto Quimbundo kikulakaji = ancião) que, nada menos, representam os espíritos dos antepassados bantos, como expressamente indicam a maioria de seus nomes simbólicos, fazendo referência às regiões africanas, encontrados nos terreiros de Umbanda até hoje: Vovó Cambinda, Vovô Congo, Pai Guiné, Pai Joaquim de Angola, Mãe Maria Conga, etc. Assim como, encontra-se nos relatos dos tempos sofridos da escravidão, a alusão a sua moradia mítica “Aruanda”, misteriosa e adorável região de paz e luz que se transformou, para o negro banto de antigamente e para o umbandista de hoje em dia, na chamada Terra Prometida; que historicamente nada mais é que o continente africano idealizado e livre, cujo maior símbolo é a cidade de Luanda, capital da hoje República Popular de Angola. Axé!

Gustavo C M Souza, é bacharel em História pela USP e dirigente do Centro Espírita de Umbanda Ogum Sete Espadas

Para saber mais:

Livro: Bantos, Malês e Identidade Negra - Nei Lopes, editora Forense Universitária


Contato:
www.facebook.com/jorge.guerreira

Texto publicado no Jornal "O Guaíra" de 27/08/2015.